quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Reflexão

OBS.: 1° dia de férias... Estava lendo sobre o "Mito da Caverna", de Platão, e senti vontade de escrever sobre o assunto.

                 A alienação e a desigualdade social

 Transferência de domínio de algo, cessão de bens, perturbação mental em que há anulação da personalidade individual, arrombamento de espírito, loucura... Essas são apenas algumas das inúmeras definições para a palavra “alienação”, o mistério do ser ou não ser do homem.
 Segundo o filósofo alemão Karl Marx, particularmente interessado nesse aspecto da índole humana, a raiz do problema da alienação consistiria na cultura do consumo e da produção: o capitalismo. Marx, que chamava o capitalismo de “regime da exploração econômica”, alegava que a mais-valia – a diferença entre o valor produzido pelo trabalho e o salário pago ao trabalhador, que comporia a base do lucro no sistema capitalista – seria a grande arma do sistema. Desse modo, a manifestação da alienação ocorreria a partir do momento em que o objeto fabricado torna-se alheio ao sujeito criador, isto é, ao criar algo fora de si, o funcionário se nega no objeto criado.
 Entretanto, seria o capitalismo a única fonte da alienação, ou esse poderia fazer parte de um todo, sendo apenas uma de suas ramificações?
 Em nossa realidade vigente, vivenciamos uma sociedade midiática e imediatista, na superestimada “Era da Informação”. Ou seria “desinformação”?
 Todos os dias, cerca de vinte mil crianças morrem ao redor do mundo, em conseqüência da falta de alimentação e recursos. De fato, esse é um número preocupante e deveras consternador. Logo, paira a seguinte pergunta: por que motivo nossos meios de comunicação, em sua maioria adeptos do sensacionalismo, não divulgariam uma notícia de tal importância?
 A resposta, embora desagradável, é simples. Porque com esse tipo de manchete, nossa atenção seria desviada dos produtos anunciados nos comerciais, dos padrões de vida impostos nas novelas, da cultura do consumo apregoada pelos telejornais e eventos esportivos.
 Diariamente, somos bombardeados com falsas ideologias que nos transformam em seres egocêntricos e narcisistas. Um exemplo é a famosa frase, proferida pela maior parte dos jovens atualmente: “política é uma coisa chata”. Contudo, temos de nos perguntar: se programas políticos fossem transmitidos na televisão no horário das novelas, dos jogos de futebol e dos reality shows, será que a política perduraria em nossas mentes como um assunto enfadonho?
 Inicialmente, obviamente haveria um protesto generalizado. Todavia, após passar-se um mês, será que nós não nos adaptaríamos a tal medida? O ser humano é um ser influenciado pelo meio em que está inserido. Por conseguinte, devemos então refletir a respeito do que nos faz pensar da forma como pensamos, viver da forma como vivemos.
 De quem seria o ganho e de quem seria o prejuízo com, por exemplo, a ideologia “política é sinônimo de chatice”, ou, em uma de suas variações, “todos os políticos são corruptos”? Primeiramente, devemos nos lembrar a respeito do seguinte: a política brasileira é regida pela democracia e, portanto, somos nós que elegemos nossos próprios representantes. Se aqueles que colocamos a encargo do bem-estar de nosso Estado praticam a corrupção, é porque nós permitimos. O grande problema da política brasileira não reside nos políticos, mas sim no povo que os elege. Geralmente são dois fatores que culminam na insatisfação por parte da população quanto à gestão do candidato eleito.
 A parte majoritária da população associa a palavra “voto” à palavra “afinidade”. Obviamente, não devemos compactuar com opiniões divergentes das nossas, se essas apresentam incongruências quando postas em paralelo com o que, com fundamentos, acreditamos ser verdade. Em contrapartida, não devemos eleger um candidato só porque ele nos é conhecido ou por ter promovido vários eventos de divulgação – o que, infelizmente, é o que atrai a maior parte dos jovens e até mesmo adultos. Para elegermos o candidato certo, devemos pesquisar a respeito das realizações, do passado daqueles em quem pretendemos depositar, literalmente, o nosso voto de confiança.
 Contudo, nosso dever como cidadão não acaba aí, e este é precisamente o segundo motivo pelo qual nos tornamos insatisfeitos com nossos candidatos. Ainda que tenham feito sua pesquisa, avaliado o candidato com uma visão crítica, após a eleição do mesmo a porção majoritária da população não monitora o andamento de seu mandato. O fato é que negligenciamos a verdade de que nós, seres humanos, somos influenciados pelo ambiente em que vivemos. Qualquer pessoa, ao assumir uma posição de maior autoridade, mudará a sua postura de modo a se adequar ao novo posto. Não obstante, se essa pessoa não recebe a orientação adequada, acaba por se enveredar pelo caminho mais fácil, que, não raro, é precisamente o caminho que não devemos seguir. É assim que políticos acabam corruptos, caso não os sejam desde o início. Influenciados por outrem que protagonizaram a mesma história, acabam desorientados e, em meio ao turbilhão vertiginoso de informações e ideologias ao qual nossa sociedade é submetida diariamente, tornam-se egocêntricos e decidem usufruir – a partir da “verdade” capitalista que preconiza o “cada um por si” – das vantagens acarretadas pelo seu alto cargo em benefício próprio.
 Por isso, quando nos aconselham a “cobrar” de nossos políticos o cumprimento de suas propostas iniciais, estaremos beneficiando a sociedade em seu todo, inclusive o próprio candidato, que não se deixará corromper.
 E quanto aos padrões de vida atuais? A mídia nos dita o que vestir, o que comer, aonde ir, o que pensar. Transmitem para nós um conceito utópico de perfeição que, de fato, não existe. Uma das principais características da humanidade é a sua pluralidade. Ao tentarmos ser todos iguais, visando um modelo único de como ser, acabamos dirimindo parte de nossa natureza humana. As conseqüências desse processo de anulação do ser são inúmeras, tendo como um dos principais exemplos os distúrbios alimentares decorrentes da imposição de um modelo de perfeição estética simplesmente inatingível para seres humanos normais e da pressão da mídia a respeito dos “benefícios” de se tornar uma pessoa detentora desta “perfeição”.
 Na verdade, independentemente da forma, todos nós somos seres alienados por algo, devido à natureza influenciável dos seres humanos. No entanto, há o tipo benéfico de alienação e o tipo maléfico; portanto, a solução é saber filtrar as boas influências das prejudiciais.
 Devemos visualizar o processo de alienação como um todo, com seus inúmeros campos de alcance, e quais as suas conseqüências. A partir do momento que permitimos que o nosso discernimento seja afetado negativamente por influência externa, toldamos nossos próprios olhos para a realidade. Nossa visão crítica é distorcida com as falsas idéias da realidade com que poluem a nossa mente. Ocupados, então, com as questões corriqueiras da vida alienada, como o consumo e o culto à beleza, viramos as costas para o verdadeiro mundo exterior, mergulhando na escuridão de nossa “caverna”, na nossa zona de conforto. Não há nada errado em querer cuidar da aparência ou desejar uma vida financeira melhor. Muito pelo contrário. Em contrapartida, viver somente em busca do superficial não leva a lugar algum.
 Assim começa a desigualdade social, em um mundo onde o caminho da maioria – absorta demais em sua própria vida para se interessar pelo que ocorre ao redor, pelo que acontece a outros seres humanos com menos sorte, mas, independentemente de qualquer coisa, seus iguais – é decidido pela minoria – que, por sua vez, tira proveito de sua posição e os guia como se fossem marionetes.
 É confusa, para uma pessoa alienada, a relação entre a alienação e a desigualdade social, pois a mesma enxerga a desigualdade social como uma fatalidade, e não como uma conseqüência. A partir do momento em que essa pessoa enxergar a conexão entre ambas as coisas, não mais será uma pessoa alienada. Terá olhado para o Sol e deixado de ser habitante da caverna.


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